fotogramas de Twin Peaks, Ep.9 (1990) - David Lynch
Natural Born Killers (1994) – Oliver Stone
Natural Born Killers
satiriza uma sociedade entorpecida pelo espectáculo da violência. Mickey
(Woody Harrelson) e Mallory (Juliette Lewis) são o produto desse ambiente. Quando
os dois se cruzam, começa a cozinhar-se uma explosão que culmina numa viajem pelos USA matando pessoas ao acaso e
certificando-se que o seus actos não passam despercebidos. Mickey e Mallory Knox obedecem apenas às suas
próprias regras e a relação que têm um com o outro alimenta e é alimentada pelos
crimes que cometem juntos. O casal vive numa bolha onde só existem eles
os dois e comportam-se como se fossem os protagonistas do seu próprio filme de
acção. Sempre conscientes da imagem que os meios de comunicação projectam
deles, Mickey e Mallory vêm-se como heróis, seres humanos superiores.
O
verdadeiro centro do filme não são os assassinos mas sim a forma doentia como a
sociedade reage a eles e os retrata e glorifica. Em Natural Born Killers, Mickey e Mallory são instantaneamente transformados
nas celebridades do momento. Através dos crimes que cometem, atingem aquilo que
é uma das grandes aspirações de uma sociedade dominada pelos valores do espéctaculo:
Fama. Os outros personagens são completamente intoxicados pela fama deles e
pelo ambiente de circo que os rodeia: o repórter que entrevista Mickey na
prisão está visivelmente entusiasmado por conhecer o homem que lhe vai fazer
muito dinheiro; à porta do tribunal, uma multidão manifesta-se em sinal de
apoio aos assassinos, como se eles fossem estrelas de cinema. Às tantas, acabam
por ser tratados como se fossem realmente os heróis que imaginam ser, numa
espécie de delírio colectivo.
Natural Born Killers
é uma espécie de ave rara: um filme de estúdio experimental. Através da forma
como filma, Oliver Stone acompanha os seus personagens enquanto eles quebram todas
as regras: montagem frenética, vários formatos de filme, jogos com os pontos de
vista, animação… isto e muito mais contribui para um resultado final que é uma
explosão psicadélica. O mundo construído por Stone em Natural Born Killers é um mundo plástico, colorido e surreal, como
um espelho que o realizador coloca em frente da sociedade americana e que
distorce e exagera a realidade de forma a despertar o sentido crítico.
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imagem de Bonnie and Clyde (1967) - Arthur Penn |
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imagem de Badlands (1973) - Terrence Malick |
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imagem de Natural Born Killers (1994) - Oliver Stone |
"Grantaire, completamente bêbedo, atordoava os ouvidos dos que o rodeavam, num dos cantos, discorrendo em voz atroadora e gritando:
Tenho sede. Mortais, eis o meu desejo: que o tonel de Heidelberga tenha um ataque apoplético e que eu seja uma das doze sanguessugas que lhes mandem aplicar. Eu queria beber, porque desejo esquecer a vida. A vida é uma hedionda invenção de não sei quem. Uma coisa que não dura nada e nada vale; e matamo-nos para viver. A vida é uma armação quase a vir abaixo. A felicidade, um painel pintado só de um lado. O Eclesiastes diz que tudo é vaidade, e eu penso como este pobre homem que decerto nunca existiu. Zero vestiu-se de vaidade, porque não queria andar nú. Ó vaidade, que tudo encobres com os teus palavrões! Uma cozinha é um laboratório, um dançarino é um professor, um saltimbanco é um ginasta, um jogador de soco é um pugilista, um boticário é um químico, um cabeleireiro é um artista, um pedreiro é um arquitecto, um jóquei é um desportista, um bicho-de-conta é um pterigobrânquio. A vaidade tem avesso e direito; o direito é estúpido, é o preto coberto de avelórios; o avesso é tolo, é o filósofo coberto de farrapos. Lamento um e rio-me do outro. As chamadas honras e dignidades, e mesmo a honra e a dignidade, são geralmente coisas que nada valem. Os reis fazem um joguete do orgulho humano. Calígula fazia cônsul o seu cavalo; Carlos II armava cavaleiro um lombo de vaca. Ora imaginai-vos entre o cônsul Esporeado e o barão Bife. (...)"
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