Sean Durkin e Antonio Campos (Afterschool, 2008) são, juntamente com Josh Mond, os fundadores da Borderline Films, promissora produtora no panorama do cinema independente americano da actualidade. Martha Marcy May Marlene, estreado no Festival de Sundance em 2012, é o retrato de uma jovem que acabou de escapar do seio de um culto. O filme inicia-se com a fuga de Martha da quinta onde vivia com um grupo de outros jovens e decorre na casa de férias da irmã e do cunhado, onde ela se refugia, explorando o estado emocional da personagem através de uma ambiência sombria e de grande tensão.
Sean Durkin faz-nos deslizar entre duas linhas narrativas: o presente da acção e as memórias que Martha tem do que se passou. O facto de existirem dois presentes em simultâneo nunca se torna confuso devido à linearidade de cada plano de acção. O passado da personagem é desvendado através de flashbacks de episódios que nos vão, aos poucos, facultando informação acerca da vida de Martha e do funcionamento do grupo a que ela pertenceu, delineando uma imagem cada vez mais negra da sua experiência. Machista e baseado na personalidade de um líder carismático, este culto faz, em vários pontos, lembrar a “ família” de Charles Manson. Em Martha Marcy May Marlene é Patrick, interpretado por John Hawkes, quem manipula os restantes membros, usando os seus medos e fragilidades para os prender e tornar dependentes. Sem ser explicitamente violento, este personagem é arrepiante pela frieza com que leva a cabo o processo de manipular e despir de identidade as jovens raparigas que caem na sua “rede”. Fá-las sentirem-se especiais e dá-lhes uma sensação de pertença ao mesmo tempo que as molda à sua vontade, começando invariavelmente por lhes atribuir um novo nome (no caso da personagem principal, Marcy May). No seio do grupo, não existe propriedade pessoal, nem mesmo do próprio corpo. Acima desta regra está apenas Patrick, que tem uma cama só para si. Um dos momentos mais arrepiantes acontece quando, depois de Martha ter sido violada por Patrick, uma das raparigas, que teria passado pelo mesmo anteriormente e olha para a experiência como algo bom, lhe diz: “You nedd to share yourself. don’t be selfish”.
A partir do momento em que decide juntar-se àquelas pessoas, Martha está irreversivelmente perdida para a sociedade de onde veio e, quando decide fugir do seio do grupo, fica totalmente à deriva, sem referências. Já não sabe viver no mundo onde cresceu. Os seus comportamentos são socialmente desadequados e chocam a irmã e o marido desta que, inicialmente, a acolhem com boa vontade. Por outro lado, Martha também não pode regressar ao culto que abusava dela e lhe estava a destruir a identidade. Perdida e destroçada, não procura respostas nem um caminho a seguir, flutua numa espiral de medo e o seu único desejo é existir em paz. A própria irmã e o marido, que não fazem ideia de onde ela esteve nem o que passou, começam a rejeitá-la e a temê-la quando as suas atitudes se tornam cada vez mais estranhas e incompreensíveis e ela se recusa a justifica-las.
À medida que o filme progride e a personagem vai tentando processar as suas experiências, a linha entre realidade e delírio começa a esbater-se. Uma vez que a informação do que se passou nos é facultada através das memórias de uma mente confusa e traumatizada, essa confusão e paranóia são transferidas directamente para o espectador e tudo se passa num mundo anterior às palavras e à racionalização. Martha Marcy May Marlene é uma primeira obra notável que vive muito de um ambiente negro e cuidadosamente arquitectado, bem como do trabalho dos seus actores, especialmente de Elizabeth Olsen cujo brilhante desempenho como Martha lhe valeu vários prémios e nomeações.
Sean Durkin and Antonio Campos (Afterschool, 2008) are, along with Josh Mond, the founders of Borderline Films, an important name in the panorama of today's American independent cinema. Martha Marcy May Marlene, premiered at Sundance in 2012, is the portrait of a young woman, Martha, who has just escaped from the bosom of a cult. The film begins with her escape of the farm where she lived with a group of other young people and is held in the vacation home of her sister and brother in law, where she takes refuge, exploring the character's emotional state through a dark ambience and great strain.Sean Durkin makes us slip between two storylines: the time of the main action and Martha's memories about her life of the previous two years. The existence of two simultaneously present never becomes confusing due to the linearity of each plan of action. The past of the character is unveiled through flash backs of episodes that, slowly , provide information about Martha's life and the group to which she belonged, outlining an increasingly dark picture of her experience. Sexist and based on the personality of a charismatic leader, this cult does, at various points, resembles the Charles Manson's "family". In Martha Marcy May Marlene is Patrick, played by John Hawkes, who manipulates the other members, using their fears and weaknesses to arrest them and make them dependent. Without being explicitly violent, this character is chilling by the coldness with which carries out the process of manipulating and destroy the identity of young girls who fall in his "net". He makes them feel special and gives them a sense of belonging while shapes them to his will, beginning invariably by giving them a new name (for the main character, Marcy May). Within the group, there is no personal property, not even the body itself. Above this rule is only Patrick, who has a bed just for him. One of the most chilling moments is when, after Martha has been raped by Patrick, one of the girls, who would have previously gone through the same and looks at the experience as something good, says, "You nedd to share yourself. do not be selfish. "From the moment she decides to join those people, Martha is irreversibly lost to society where she came from, and when she decides to run away from the group, she is completely adrift, with no references. She doesen't know how to live in the outer world anymore. Her behavior is socially inappropriate and hatch her sister and her husband who initially accept it willingly. Moreover, Martha can not return to the people that were abusing her and destroying her identity. Lost and broken, not looking for answers or a way forward, floating in a spiral of fear, her only desire is to exist in peace. Martha's own sister and her husband, who have no idea where she was or what happened, begin to reject and fear her when her attitudes become increasingly strange and incomprehensible and she refuses to justify them.As the film progresses and the character tries to process her experiences, the line between reality and delusion begins to blur. Since the information of what went on is provided through the memories of a traumatized and confused mind, confusion and paranoia are transferred directly to the viewer and everything happens in a world previous to the words and rationalization. Martha Marcy May Marlene is a remarkable first film that lives from a black and carefully architected ambience, and from the work of its actors, especially Elizabeth Olsen who plays Martha and whose brilliant performance won her several awards and nominations.