Bin Jip, Ferro 3 em Português, conta-nos a história de um jovem rapaz solitário que invade a casa de pessoas quando estas não estão. Para além de usar as casas alheias, arranja pequenas coisas que se encontram avariadas e trata da roupa suja dos proprietários, demonstrando uma ética pessoal que nos impede de condenar o seu acto que, de resto, percebemos ser uma táctica de sobrevivência de alguém que se desligou da sociedade. Um dia, numa das casas que pensa estar vazia, encontra uma jovem mulher que se encontra presa num casamento violento. Entendem-se. Ela parte com ele. Apaixonam-se e, apesar da violência do mundo exterior que ameaçam separá-los, conseguem finalmente estar juntos.
Esta história de amor é, ao mesmo tempo, simples e bizarra e tudo isto se passa sem que os dois protagonistas pronunciem uma única palavra. Esta opção pelo silêncio, um silêncio carregado de sentidos é, aliás, uma das marcas de Ki-Duk Kim, presente em filmes como Primavera, Verão,Outono, Inverno, Primavera (2003) ou A Ilha (2000). Em Bin Jip, o par romântico do filme não fala, nem sequer um com o outro. O entendimento e o amor que se desenvolve entre os dois dá-se através de olhares, gestos e atitudes como se comunicassem num plano superior que “os outros” não compreendem nem poderiam compreender, como se tivessem poderes telepáticos que só funcionam entre eles os dois, seres etéreos. A reacção dos restantes personagens ao inabalável silêncio de ambos é de incompreensão e, frequentemente, de violência.
O facto de se manterem silenciosos sob todas as circunstâncias sem qualquer esforço de comunicação, nem sequer quando são interrogados pela polícia, faz com que estes dois personagens tenham um carácter fantasmagórico. Eles são seres à parte que passam pelo mundo como vapor. Entram nas casas das pessoas e alteram pequenas coisas mas quase não deixam rasto. Pensaríamos, mesmo, que estas duas personagens não são reais, não fossem as consequências das suas acções, nem sempre benéficas, e a reacção dos “outros” a eles. Não lhes percebemos qualquer paixão ou desejo, a não ser um pelo outro. Ela vivia já uma vida resignada à violência doméstica, como se fosse um corpo de cartão. Ele vagueava sozinho conseguindo subsistir através do seu método rigoroso. E é, precisamente, a paixão um pelo outro que os faz descurar os mecanismos de defesa que mantinham até então, tornando-os vulneráveis a agressões exteriores mas, dando-lhes esperança e fazendo-os renascer.
Bin Jip é uma experiência única e comovente, filmado com grande sensibilidade e subtileza e é um excelente exemplo do cinema oriental, que se tem assumido, nos últimos anos, como um dos mais interessantes e vivos da actualidade. Apesar de não ser reconhecido na sua terra natal, a Coreia do Sul, o trabalho de Ki-Duk Kim tem vindo a receber reacções entusiásticas nos festivais internacionais, tendo recebido dois prémios de melhor realizador em 2004 por Samaria e Bin Jip nos festivais de Berlim e de Veneza, respectivamente.
Bin Jip
Bin Jip
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Bin Jip, 3-Iron in English, tells the story of a lonely young man who breaks into the house of people when they are not there. In addition to using other people's houses, he fixes little things that are broken and does their dirty laundry, showing a personal ethic that prevents us from condemning his act, perceive to be a survival tactic of someone who is cut off from society. One day, in one of the "empty" houses he finds a young woman who is trapped in a violent marriage. They understand each other. She leaves with him.They fall in love and, despite the violence of the outside world that threaten to separate them, can finally be together.This love story is at the same time simple and bizarre and it all goes by without the two main characters say a single word. This option for silence, a silence full of meaning, is one of the hallmarks of Kim Ki-Duk, present in films such as Spring, Summer, Fall, Winter, Spring (2003) or The Isle (2000). In Bin Jip, the romantic couple does not talk, not even with each other. The understanding and love that develops between the two takes place by looks, gestures and attitudes as they communicate on a higher plane, one that "others" could not understand or comprehend, as if they had telepathic powers that only work between the two of them, ethereal beings. The reaction of the remaining characters to the unshakeable silence of both is of incomprehension and is often violent.
The fact that they keep silent under all circumstances without any effort to communicate, even when they are questioned by the police, makes these two characters have a ghostly character. They are the beings that pass through the world as vapor. They enter people's homes and change small things, but leave almost no trace. We would think, even, that these two characters are not real, were not the consequences of their actions, not always beneficial, and the reaction of "other" to them. We do not perceive any passion or desire, but to each other. She has lived a life resigned to domestic violence, like a card body. He wandered alone managing to survive through its rigorous method. And it is precisely the passion for each other that makes them neglect the defense mechanisms that held them so far, making them vulnerable to external aggression, but giving them hope and making them reborn.Bin Jip is a unique and moving experience, shot with great sensitivity and subtlety and is an excellent example of eastern film, which has become, in recent years, one of the most interesting and alive today. Although not recognized in his native South Korea, the work of Kim Ki-Duk has received enthusiastic reactions in international festivals and received two awards for best director in 2004 for Samaria and Bin Jip at Berlin and Venice festivals, respectively.